A Renamo e o MDM estão insatisfeitas com a forma como decorreu o recenseamento eleitoral e exigem que o mesmo seja prorrogado. Do lado oposto, a Frelimo diz que faz uma avaliação positiva do processo e não vê motivos objectivos para prorrogação.
O presidente da Renamo, Ossufo Momade, convocou a imprensa um dia antes do fim do recenseamento para manifestar a indignação do partido com o processo.
“Avarias programadas dos mobiles ID, redução premeditada de brigadas, promoção criminosa de dupla inscrição de funcionários públicos e elaboração de listas fantasmas nos cadernos eleitorais são problemas intencionalmente criados pelos órgãos de gestão eleitoral para impedir a inscrição de eleitores nas zonas de influência da Renamo”, disse o líder da Renamo em teleconferência.
“Apesar destes graves problemas que põem em causa o direito legítimo e constitucional que assiste os moçambicanos de elegerem e serem eleitos, o governo da Frelimo está calado, sereno e impávido”, disse. “Ao organizar estes esquemas fraudulentos a Frelimo pretende perpetuar-se no poder de forma ilícita e ilegítima”.
Face ao exposto, o líder da Renamo exigiu a prorrogação do recenseamento eleitoral sem, no entanto, pôr em causa o dia da votação; a alocação de meios para o funcionamento efectivo dos postos de recenseamento eleitoral; a demissão imediata do Director Geral do STAE, Felisberto Naife, por não estar a defender os interesses mais nobres dos moçambicanos e; Procuradoria Geral da República para accionar mecanismos necessários de modo a responsabilizar o Governo e a Comissão Nacional de Eleições e o STAE.
MDM vai formalizar pedido de prorrogação do recenseamento eleitoral
O Movimento Democrático de Moçambique (MDM), terceira força parlamentar no país, vai avançar com um pedido formal de prorrogação do recenseamento eleitoral, por pelo menos 10 dias, de modo a permitir que as pessoas que ficaram sem se recensear por conta dos problemas técnicos, tenham a oportunidade de fazê-lo, disse ao Boletim, Manuel Domingos, secretário-geral do partido.
“Já estamos a mover-nos ao nível da nossa sede nacional para ver se o processo seja prorrogado porque houve constrangimentos como paralisações constantes provocadas por inexistência ou fragilidade de fontes alternativas de energia, postos de recenseamento que nunca funcionaram desde o início do processo, por alegados problemas técnicos”, disse Domingos.
O secretário-geral do MDM fez saber que o seu partido olha com estranheza para a decisão do STAE de não prorrogar o prazo do recenseamento tendo em conta os problemas que se verificaram ao longo do processo.
“Tinha que haver um pouco de bom senso por parte dos órgãos de gestão eleitoral em admitir que os problemas criados pelas intempéries na zona centro e norte do país condicionarão o alcance das metas”, disse. Este processo demonstra ser fraudulento a partir dos órgãos eleitorais”, acrescentou.
O secretário-geral do partido acusou ainda o Secretariado Técnico de Administração Eleitoral (STAE) de mostrar favoritismo ao partido Frelimo. “Os nossos vogais não foram permitidos fazer a fiscalização das brigadas alegando falta de combustíveis para abastecer as viaturas”, lamentou.
Frelimo faz balanço positivo
No outro extremo o partido Frelimo faz um balanço positivo do recenseamento, embora reconheça que o mesmo tenha decorrido em meio à desafios como os ciclones Idai e Keneth que condicionaram o processo no centro e o norte do país.
“Olhando para os dados que nos foram disponibilizados pelos órgãos eleitorais, achamos que, com todos os desafios que o país enfrenta neste momento, o recenseamento foi positivo”, disse ao Boletim Caifadine Manasse, porta-voz do partido Frelimo.
Faltando quatro dias para final do recenseamento, o STAE havia inscrito 5 380 161 eleitores, o que representa 73.28% da meta prevista. Nossa pesquisa prevê que o total de eleitores inscritos até hoje (30 de Maio) não excederá 80% da meta prevista pelo STAE. Entretanto, o porta-voz da Frelimo prefere olhar para estes números de uma forma conservadora. “Consideramos normal uma vez que nos outros anos nunca se excedeu a meta de 90%”, disse. “O recenseamento já foi feito, os dados já estão lá”, acrescentou.
O Boletim reportou casos de recolha compulsiva de cartões de eleitor e dupla inscrição de funcionários públicos alegadamente à mando da Frelimo. O porta-voz daquele partido refutou as acusações e considerou a informação como sendo “manipulação da oposição”.
“Acho que são manobras dilatórias da oposição para tentar fazer desacreditar o processo”, avançou.
Partidos da oposição e organizações da sociedade civil que acompanham o recenseamento de perto têm advogado a prorrogação do recenseamento em curso no país, uma medida que está longe dos cálculos do STAE. Manasse disse, à propósito, não haver “razões objectivas” para a prorrogação do recenseamento.
“Não podemos prorrogar só por prorrogar, uma vez que, neste momento, há brigadas que operam, mas os eleitores não se vão recensear”, disse. Há desafios que devem ser ultrapassados nos próximos anos, temos que aprimorar as campanhas de educação cívica”, acrescentou.
Múltiplos ataques obstruíram recenseamento eleitoral em Cabo Delgado
Grupos armados que vêm atacando a província de Cabo Delgado desde Outubro de 2017, fizeram forte investida durante o recenseamento eleitoral, impedindo a abertura de postos de recenseamento no litoral do distrito de Macomia, atrasando o início de recenseamento no distrito de Mocímboa da Praia. Nos distritos de Meluco, Palma, Nangade os ataques levaram ao encerramento de postos durante alguns dias.
Cabo Delgado foi atingido por ciclone Kenneth no dia 25 de Abril, seguindo-se chuvas torrenciais por quase mais uma semana. Logo que o tempo melhorou, os insurgentes começaram a atacar. O CIP registou 11 ataques ao longo do mês de Maio, em 5 distritos, que resultaram em 22 mortos, dezenas de feridos, centenas de casas incendidas e aldeias abandonadas despovoadas.
No dia 3 de Maio, cerca de 21 horas, homens armados invadiram a aldeia de Nacate, distrito de Macomia, mataram 6 pessoas e queimaram dezenas de casas.
No dia 4 de Maio, os insurgentes atacaram as aldeias de Ntapuala e Banga -Velha, de novo no distrito de Macomia, matando 4 pessoas, incluindo um professor que encontraram na rua a conduzir motorizada. Outras três pessoas morreram carbonizadas dentro de casas incendiadas.
No mesmo dia 4, os atacantes invadiram as aldeias de Iba e Ipho, no distrito de Meluco, mas não houve vítimas humanas porque as pessoas já haviam se refugiado nas matas. Saquearam as casas e incendiaram-nas. Nos dias subsequentes não houve recenseamento nestas aldeias.
No dia 05 de Maio, insurgentes atacaram a aldeia de Minhanha, no distrito de Meluco e mataram 3 pessoas, queimaram cerca de 100 casas, obrigando ao encerramento temporário de cinco postos de recenseamento nas aldeias atacadas e vizinhas.
No dia 10 de Maio, os insurgentes atacaram a estrada principal que liga a capital Pemba e o distrito de Palma. O ataque foi no cruzamento de Olumbi, entre Mocímboa da Praia e Palma, tendo como alvo um camião que transportava mercadorias para Palma e uma mini-bus de transporte de passageiros. Duas pessoas que seguiam na mini-bus morreram no local. Os corpos foram transladados para o Hospital de Palma.
No dia 11 de Maio, na aldeia de Mangoma, que dista a cerca de 10 km da Vila sede de Mocímboa da Praia, três cidadãos foram surpreendidos a caminhar numa rua de terra batida. Mataram e deceparam cabeça de dois e um foi amarrado e torturado e mais tarde liberto e enviado para comunicar nas aldeias próximas que a população devia abandonar porque serão atacados.
Dia 13 de Maio, na aldeia de Pequeue um cidadão foi morto nos campos de produção.
Dia 14 de Maio, na aldeia de Quitarejo foram raptadas duas meninas que iam à pesca.
No dia 15 de Maio, mais um ataque na aldeia de Ngalonga, distrito de Nangade. Não houve mortes porque a população já havia se refugiado às matas. “Por conta deste ataque, nos dias seguintes as brigadas de recenseamento eleitoral nesta aldeia estiveram paralisadas”, reportaram nossos correspondentes.
No dia 16 de Maio, os insurgentes atacaram o bairro de Bagala, distrito de Palma. Mataram um cidadão a tiro e um outro sobreviveu ao balizamento no peito e foi levado ao hospital de Palma. Queimaram ainda 70 casas, forçando a população a abandonar a aldeia.
No dia 18 de Maio, houve mais um ataque na aldeia de Ngalonga, desta vez no início da noite antes das pessoas se refugiar para as matas. Uma pessoa foi morta, duas raptadas e dezenas de casas incendiadas.
No dia 21 de Maio, mais um ataque na aldeia de Iba, distrito de Meluco. Não houve vítimas humanas e no dia seguinte o recenseamento eleitoral decorreu normalmente, reportaram nossos correspondentes.
No dia 22 de Maio, cerca de 08 horas, houve ataque no distrito de Palma, na estrada que sai da vila-sede para posto administrativo de Pundanhar. Os insurgentes interpelaram um cortejo fúnebre que seguia em uma viatura e quatro motorizadas. Duas pessoas foram baleadas e as quatro motas foram queimadas. Os restantes foram salvos porque apareceu um carro blindado da Polícia que saía de Pundanhar para Palma em busca de alimentos.
Macomia, o distrito mais afectado pelos ataques é o único que teve postos de recenseamento que nunca chegaram a abrir porque as populações abandonaram as aldeias. Trata-se dos postos de EPC de Pequeue, EP1 de Unidade, EPC de Milamba, situados no posto administrativo de Quiterajo.
Não abriram igualmente, devido aos ataques, os postos da EP1 de Nagulue, e da EP1 EPC de Olumboa, todos no posto administrativo de Mucojo.
Macomia foi o distrito com o mais baixio desempenho em Cabo Delgado, atingindo 81%, abaixo da média provincial de 96%.